6.9.05

35 anos de solidão


Afirmava ontem alguém de forma peremptória que o nosso político redondo favorito, agora candidato à deprimente presidência da não menos deprimente república, tem a seu favor uma aparentemente inatacável vantagem: apesar da vetusta idade, possui um espírito invulgarmente jovem. Eu, pelo contrário, devo ter um espírito invulgarmente envelhecido, uma vez que isto me faz alguma confusão, confesso. E nem vem ao caso que o autor da citada alarvidade fosse, ele próprio, um fóssil com idade para ter mudado as fraldas a Matúsalem (mas, claro, também ele dono de um espírito ainda imberbe). De qualquer forma, nada disto é muito relevante, uma vez que o espírito é mesmo a única componente de um candidato a presidente da república que tem direito a ser jovem, uma vez que a nossa iluminada lei eleitoral garante que o corpinho tem de ter, no minímo, 35 bem contados anos.
Quando cheguei à minha tão esperada maioridade alambazei-me, como qualquer mocetão púbere que se preze, a fazer tudo aquilo que, até aí, me tinha sido vedado à conta da minha borbulhenta menoridade. E as coisas até se iam compondo, até que cheguei ao número 5 da Grandiosa Lista de Macacadas Pós-18 anos (assim mesmo, em maiúsculas e religiosamente copiada num caderno de argolas do He-Man), que era, exactamente, candidatar-me à presidência da república. No entanto, assim que expus este patriótico plano ao meu pai e lhe quis sacar a assinatura da ordem, fui sumariamente despachado e desinvestido das minhas presidencialistas ambições: agora que tens 18 anos podes ir alapar-te no Olimpia a ver sessões contínuas do Virgens Anais (check, tinha sido o número 3 da Lista), podes pagar impostos (Hurra!!!), podes até ser presidente da Associação de Fetichistas de Pés de Montemor-o-Novo, a única coisa que não poderás ter é poiso no Palácio de Belém, uma vez que tal está reservado para mânfios com mais de 35 primaveras.
E assim, destroçado que fui pelo mais rude golpe da minha vida desde o fim do D’Artacão, tenho desde então dedicado a minha vida à espera: à maravilhosa e edificante espera pelo meu 35º aniversário, aquele que, por artes mágicas, me transmutará de sujeito nocivo a quem não se deve confiar nem uma bicicleta sem rodas em cidadão respeitável e responsável, penteadinho e sorridente, pronto a ser ungido pelo óleo balsâmico da presidencialidade. Ele chegará.