The Hot Spot
Desmistifique-se de uma vez por todas a ideia peregrina de que o calor é agradável, é estimulante, é giro. Trata-se de uma teoria de tal forma enraizada no imaginário de virtualmente toda a gente, que nada gera maior unanimidade satisfeita em conversas de circunstância do que um atempadamente atirado: "Este fim de semana vai estar mais quentinho."
Não. O calor não é bom, não cura doenças, não é nosso amigo e deve ser encarado com as maiores reservas, se não mesmo desconfiança, se não mesmo repulsa.
O calor é invasivo, persegue-nos incessantemente para todo o lado com um atrevimento obsceno, ao contrário do modesto frio, que fica respeitosamente à nossa porta quando a tal o convidamos.
O calor é inestético, e tem nos menos afortunados o efeito vagamente bizarro de lhes espalhar manchas livído-avermelhadas pela fronha. Não é bonito de se ver.
O calor é peganhento, obriga perversamente a que o suor se insinue por todos os poros, pregas e orifícios, e transpirar é, por excelência, algo que se deseja que apenas aconteça em circunstâncias especiais, por louváveis motivos, e nunca em público (urge, a propósito, combater a turba ululante que se esfalfa a fazer desporto em público, assustando arbitrariamente idosos e criancinhas de mama).
O calor é odorífero, e a este respeito contentar-me-ei em afirmar que todos os dias de Verão me congratulo por não ter transportes públicos a martirizarem-me a existência.
E é por isto que somos Terceiro-Mundo. Porque está demasiado calor para podermos ser outra coisa qualquer. Porque não é só o calor que gera a modorra, é a própria inactividade que chama em igual medida a canícula e as mosquinhas e gera este ciclo vicioso. E tórrido. Arizoniano. Lutemos pela bênção de uma temperatura de gente civilizada.
3 Comments:
eu já conhecia o filme (aliás, de todos os que vão sair só não vi ainda o traffic), mas não tenho um único DVD. Será assim tão mau aproveitar esta borla? (a verdade é que aqui em "casa" já se lê o espesso há muitos anos, mas desta vez até me fez pena vê-lo tão magrinho)! Não o vou comprar de propósito, mas confesso que sou portuguesa de comprar jornais se oferecerem coisas jeitosas!
O mau não é, obviamente, aproveitar a borla. Eu também gosto de obter de borla coisas de que gosto/preciso. O que é triste é a borla pela borla, a ânsia de ter coisas só porque são oferecidas, mesmo que não nos digam nada. Até porque não acredito que haja uma súbita massificação de admiradores do Lost in Translation. Obrigado pela visita.
A relação calor/desenvolvimento carece de estudos mais aprofundados. A partir de que temperatura média anual existem sérios reflexos no PIB?
P.S: as férias foram boas?
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