24.11.05

Os Bananas da República

Apercebi-me repentinamente, a meio das minhas múltiplas e transcendentais tarefas quotidianas, que a eleição para Presidente da Repúbica se aproxima a passada larga, e é já daqui a não sei bem quanto tempo. Assim, e em nome do mais alto interesse da República, decidi consagrar este post do mal frequentado à causa cívica e fazer aquilo que há muito deveria ter sido feito: elaborar uma prosaica lista que enumere, sem verborreia nem artifícios, as qualidades e defeitos dos mais mediáticos candidatos, tornando assim a missão do eleitor indeciso numa simples operação de soma de virtudes e subtracção de badalhoquices. Além de servir interesses públicos ao facilitar a decisão eleitoral aqueles de entre vós que não são dotados de polegares oponíveis, darei satisfação à minha natureza mesquinho-obsessiva, que gosta de listar coisas.

Cavaco Silva
A Favor
- Mastiga o bolo-rei de boca aberta.
- Não chumbou a Matemática no 7º ano.
- É asseadinho.
- O Paulo Portas não gosta dele.
Contra
- A única coisa que faz de boca aberta é mastigar bolo-rei.
- Insiste em usar fatos saídos directamente das montras da Macmoda.
- Chama-se Cavaco.
- Chama-se Silva.
- É feio.

Mário Soares
A Favor
- Fala pessimamente francês.
- Fala atrozmente castelhano.
- Gosta de andar de bibicleta em tronco nu.
- Adormece em momentos inoportunos.
- O Paulo Portas não gosta da mulher dele.
- É gordo.
Contra
- Fica acordado em momentos inoportunos.
- Não se lembra onde mora.
- Gosta de irritar os outros fingindo que é surdo.
- Tem um filho feio.

Manuel Alegre
A Favor
- Ficaria patusco vestido de Pai Natal.
- Tem uma barba anacrónica.
- Chama-se Alegre.
- Tem uma voz perfeita para matinés radiofónicas na onda média.
Contra
- Alguém o convenceu de que sabe escrever.
- É do Benfica.
- É gordo.
- É, de uma forma geral, parvo.

Jerónimo de Sousa
A Favor
- É um dançarino exímio.
- É do proletariado, como o Lula da Silva.
- É comunista.
- Fica afónico nos debates.
- Tem uma dentadura nova.
Contra
- É um dançarino símio.
- É do proletariado, como o Jerónimo de Sousa.
- É comunista.
- Não fica afónico de vez.
- Tem uma dentadura nova.

Francisco Louçã
A Favor
- Não gosta do Cavaco.
- Não gosta do Soares.
- Não gosta do Alegre.
- Não suporta o Jerónimo.
Contra
- Tem um ódio letal a si proprio.
- É frequentemente avistado na companhia de irmãos do Paulo Portas.
- Tem uma cedilha e um acento til no nome, o que é uma grande maçada.

E é tudo. Espero que a escolha se tenha tornado tão clara para vós, como o é para mim. Para efeitos legais, declaro sob juramento solene que não sou o Garcia Pereira.

23.11.05

Lançamento do Disco (Sound)

Na última sexta-feira, horas antes de vários milhares de extasiados portugueses se renderem ao encanto retro dos anacrónicos Boney M e Village People, o normalmente insuspeito (embora presunçoso) suplemento do Público singelamente intitulado Y incluía nas suas páginas uma crítica à recentemente lançada caixa que encerra, em 9 CDs e 2 DVDs, todas as gravações jamais efectuadas pelos ABBA em estúdio. E se a edição desta nefasta caixinha de Pandora é já, em si própria, motivo mais que suficiente para aterrorizar qualquer um, a nota atribuída pelo Ypsloniano crítico à mesma justifica plenamente o pânico em massa, seguido do êxodo dos melómanos para paragens musicalmente mais evoluídas, como por exemplo as savanas do Tanganhica.
A nota foi um 10. Não se trata aqui de um 10 em 100 ou, mais plausivelmente ainda, de um 10 em 8 ziliões, mas sim de 10 em 10, que é como quem diz o equivalente numérico do céu na terra.
O fenómeno, intimamente relacionado com o concerto(?) inicialmente mencionado, não é virgem, apresentando pelo contrário uma insidiosa recorrência no seio da imprensa musical: de quando em vez, um iluminado crítico em desesperada crise criativa que o distinga dos demais mortais e o confirme como arauto messiânico do Santo Graal musical entre monos embrutecidos, vai ao seu baú de ignomínias empoeiradas e saca de lá um grupo, compositor, cantor ou movimento musical que tenha sido a seu tempo alvo de um merecido asco e que, agora, seja tratado com a distância pedida pelo seu avançado estado de putrefacção. De seguida, o crítico proclama alto e bom som, sem receio de vir a ser ostracizado pela própria mãezinha, que afinal aquele é um som de qualidade e subtileza tão astuciosamente ocultas que só ele, após anos de estudo, as descobriu. Geralmente regista-se nesta fase a adesão entusiasta da maioria dos restantes críticos, receosos de serem tomados por incultos com a sensibilidade musical de gerbilhos surdos (como somos nós, restante maralha que continua convencida que os ABBA, Village People e afins não passam de poias enfeitadas com lantejoulas).
Esta espécie de revisionismo histórico musical é cíclico, e já tentou no passado branquear ícones da boçalidade do quilate de um Burt Bacharach ou de um Tom Jones. E se lhe dermos tempo suficiente, assistiremos certamente à reabilitação dos Modern Talking ou, daqui a 20 anos, à redescoberta da Britney Spears e dos Backstreet Boys como bardos maiores do lirismo do século XXI. Eu, à cautela, vou tendo a canção-tema do D’Artacão como banda sonora dos meus dias.