23.10.05

A Gripe das Aves Raras

O infame perigo espreita em cada esquina, em cada vão de escada, nas praças e nos cafés, nas casas e nas avenidas, nas escolas e nos prostíbulos. Nada nem ninguém está a salvo do alarmismo mediaticamente histérico em torno da gripe das aves. Os arautos das desgraças com data e hora marcada estão em frenesim, e não há neste país galinhola constipada, codorniz com catarro, ganso ranhoso ou pato com pé-de-atleta que não seja imediatamente interpelado por um pressuroso profissional de microfone em riste para uma grasnada entrevista.
Este flagelo, que, a fazer fé nos guinchos estridentes de jornalistas aterrorizados acolitados por governantes alarmados, será potencialmente devastador para grande parte da espécie humana, tem mais de um século de existência e já provocou na Ásia cerca de 70 óbitos. Impressionante, não é? É claro que quem conheça minimamente a Ásia e a sua realidade social e cultural facilmente compreenderá a insignificância ridícula deste número, que prova não só a fraquíssima propagação do vírus, como também a enorme dificuldade na transmissão ave/homem (tendo em conta a quantidade e proximidade do contacto que a generalidade da população asiática tem com aves vivas, dir-se-ia que a gripezita não passaria de uma DST reservada para quem obriga a galinhagem a condutas impróprias). É claro também que basta uma vulgaríssima busca googleana para revelar que o anacrónico bacilo de Koch mata por hora bem mais do que esta gripe de capoeira matou em cem anos de honrado esforço. Mas é mais claro ainda que o pânico vende desmesuradamente, e que as mortes tuberculosas do bacilozito de Koch, no seu encanto empoeirado e demodé de heróis tísicos do romantismo do séc. XIX, não são rival para a gripe alada do séc. XXI, desfiada como contas de um rosário invisível perante a embasbacação atemorizada da mediocridade reinante. Correi para as farmácias. Ou para outro sítio qualquer. And may God have mercy on us all…

4 Comments:

At 9:59 da manhã, Blogger Purpurina Cor de Rosa said...

Este assunto já cheira, de facto, muito a mofo. Não se aguenta as entrevistas bombásticas a criadores de galináceos, à mistura com a descontracção por parte de quem vende os ditos em feiras. Etrevistas exclusivas a médicos e veterinários (como se fossem tão poucos quanto isso) e debates televisivos estão an ordem do dia. Será que alguém ja se lembrou, no meio deste alarmismo todo, que de 3 em 3 segundos morre uma criança de fome nos países subdesenvolvidos e a receita para tal é bem mais simples do que um tamiflu. Se calhar não é tão sencionalista.
Anyway, gostei muito do texto, acho que expressa bem também a minha poupando-me ao esforço de repisar mais sobre o assunto.
Bjokas e continua a escrever

 
At 10:01 da manhã, Blogger Purpurina Cor de Rosa said...

*Anyway, gostei muito do texto, acho que expressa bem também a minha opinião poupando-me ao esforço de repisar mais sobre o assunto.
(desculpa o lapso)

 
At 10:14 da manhã, Blogger Purpurina Cor de Rosa said...

Eu coloquei aquele artigo o que não implica que concorde com tudo o que ele diz. Acho apenas curioso a opinião de um estrangeiro sobre nós.
Obrigada pelo elogia. Queria escrever qualquer coisa mas com esta historia da gripe das aves parece que me falham noticias e que tenha de ir rebuscar qualquer coisa fora da actualidade.
Bjokas,
Alian Duarte

 
At 1:57 da tarde, Blogger Purpurina Cor de Rosa said...

Se a Costa é má que baste, a Cova do Vapor é a degradação em forma de vila (aldeia ou um outro qualquer amontoado de casas).
Eu já voltei aos mundos bloguianos, agora faltas tu ;)
Bjokas

 

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